Mulheres tiram
sustento do que é descartado
Depois de separados, os materiais recicláveis são beneficiados e encaminhados para várias indústrias de SP que compram o produto.
O lixo é conhecido pelo ser humano como tudo aquilo que não
tem mais valor e nem condição de ser usado. Um grupo formado por 26 mulheres
tem uma visão diferente deste pensamento. Reunidas numa recém-criada
cooperativa de reciclagem em Araçatuba, elas obtêm o seu ganha-pão por meio
daquilo que a sociedade descartou um dia.
A Cooper Araçá (Cooperativa de Coleta Seletiva e
Beneficiamento de Materiais Recicláveis de Araçatuba) é composta por 26
mulheres e 3 homens. O grupo atua nas instalações do aterro sanitário,
localizado na zona rural. A cooperativa tem o apoio da Prefeitura de Araçatuba
e da Revita Engenharia, empresa responsável pela limpeza pública.
O salário dos cooperados é pago com a venda dos recicláveis
coletados no município. A faixa etária do grupo varia de 19 a 56 anos de idade.
Em comum, são pessoas que trabalhavam de forma perigosa com o lixo. Alguns
exerciam funções com baixíssima remuneração, se encontravam em situação de
vulnerabilidade social ou não tinham trabalho.
Janete Araújo de Oliveira, 52 anos, coletou material
reciclável na rua por um ano. Ela começou a recolher lixo por não querer ser
mais empregada doméstica. O primeiro transporte usado para o serviço foi um
carrinho de bebê, improviso que durou até ela conseguir um carrinho adequado. O
trabalho começava antes de o sol nascer, mas o rendimento não ultrapassava R$
200 por mês.
"Eu pegava muito dia de chuva", diz Janete, ao se
recordar do passado. Ela foi uma das primeiras a fazer parte da Cooper Araçá,
inaugurada em julho de 2011. Na nova função, ela demonstra agilidade e chega a
separar, simultaneamente, dez tipos diferentes de resíduos. Com um ganho maior,
está mais fácil pagar os gastos de casa, onde também vivem a filha, de 20 anos,
e o neto, 4 anos.
PARTICIPAÇÃO
As cooperadas chegam a separar e a beneficiar 60 toneladas
de recicláveis ao mês, em média. Todo recurso obtido com a venda do material
para indústrias de reciclagem do Estado é revertido no salário dos
trabalhadores, que varia de R$ 500 a pouco mais de R$ 900.
Os ganhos poderiam ser maiores, pois o material reciclado
representa apenas 1,1% das 5,4 mil toneladas de lixo geradas mensalmente no
município.
De acordo com a presidente da Cooper Araçá, Zenaide dos
Santos, 55, se a população separasse o lixo seco, como plástico, alumínio e
papel, do orgânico, o volume de material apto para a reciclagem seria maior. A
meta da cooperativa é a de ultrapassar a marca de 100 toneladas de recicláveis
ao mês, além de gerar mais empregos e aumentar o quadro de cooperados.
"Eu observo que as pessoas descartam a maior parte do
material reciclável no lixo orgânico. Por isso, muito material que poderia ser
reciclado acaba passando e vai parar no aterro", afirma Zenaide. Antes de
ser a líder na cooperativa, ela trabalhou catando recicláveis na rua por 9
anos.
Gabriel Lopes, supervisor da Revita, confirma o diagnóstico
da cooperativa e afirma que o município tem capacidade de aumentar o volume de
resíduos reciclados. "É fundamental a conscientização e a educação
ambiental em descartar os recicláveis da maneira correta. Talvez um
entendimento maior de para onde isso está indo, como é feito é quem está sendo
ajudado motivaria mais as pessoas", afirma.
O biólogo José Luís de Carvalho Sales, da Secretaria
Municipal de Meio Ambiente de Araçatuba, diz que, basicamente, as pessoas devem
separar o lixo seco do úmido. "Muitas pessoas mandam só a latinha de
alumínio e o tetra pak, mas se esquecem de que as latinhas de concentrados
também podem ser recicladas", lembra.
ETAPAS
Na última semana, a Folha da Região acompanhou o trabalho da
cooperativa. A primeira etapa consiste em descarregar o material coletado num
fosso, trabalho feito pela Revita Engenharia. Com o auxílio de uma máquina
coletora, a cooperada Célia Calixto Silva, 46, junta montes de lixo, já
devidamente selecionado pela população, para depositá-los na esteira de
separação, onde atua a maior parte das cooperadas. Depois de separados, o
reciclável é beneficiado e encaminhado para várias indústrias do Estado, que
compram o produto.
As irmãs Neusa Mendes de Souza, 48, e Terezinha Mendes de
Souza, 55, apontam a segurança em trabalhar na cooperativa. "Aqui eu tenho
mais segurança, antes eu não tinha. Não usava máscara e nem luva. Banheiro,
então, nem se fala", diz Terezinha, que já chegou a trabalhar até no
antigo lixão.
As duas têm alguns sonhos, que esperam conseguir por meio da
coleta de recicláveis. Enquanto Terezinha imagina o dia em que conseguirá
fechar as rachaduras de sua casa, Neusa pensa em poder comprar alguns móveis
que ainda não tem para viver com mais conforto.
Os planos se confundem com os de outras mulheres, mas
dependem do empenho da população em colaborar com a coleta seletiva para serem
alcançados.
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